Em nenhum lugar do Brasil aparecem empresas novas nas licitações de transporte público. Os motivos? Basicamente dois: o alto custo de manutenção de uma empresa de ônibus é um. O outro é a instabilidade regulatória, uma chaga para qualquer setor econômico e razão para afugentar investidores, afinal de contas, ninguém é doido de injetar dinheiro no negócio em que uma hora vale uma coisa, e outra hora outra. E o transporte público não vai funcionar enquanto os seus órgãos gestores não forem realmente estruturados. Assim pensa o engenheiro de tráfego e deputado estadual pela Paraíba, Carlos Batinga, 62 anos, primeiro especialista a projetar um Plano Diretor de trânsito para Natal, em 1979 (e tornou-se uma referência nacional), que conversou com o Novo Jornal na semana em que o prefeito Carlos Eduardo, acompanhado pela Câmara Municipal de Natal (CMN), vetou o projeto de lei 98/2013 (dá a gratuidade nas tarifas de transporte público a estudantes), da vereadora Amanda Gurgel (PSTU).
Passando uma informação dos bastidores, Batinga diz que o projeto foi alvo de chacota durante as rodas técnicas no congresso mais recente da Agência Nacional de Transportes Públicos (ANTP), por não versar nada sobre a fonte dos recursos para custear os subsídios. “Do jeito que estava, não existe. São os poderes executivos que devem determinar de onde vêm as fontes de custeio”, diz o engenheiro.
Ele foi secretário (na época, superintendente) de Transporte e Trânsito Urbano (STTU), do fim de 1979 até o final de 1985 e diz que o Plano Diretor foi pensado para toda a Grande Natal, como o resultado de uma parceria entre os governos federal, municipal e estadual. O dinheiro estava no caixa, pois o governo federal estabeleceu um convênio com o Banco Mundial (BIRD) para bancar do projeto à sua implantação.
A primeira linha internacional de financiamento, chamada na época de BIRD I, veio um pouco antes, em 1975, quando foi criada a estatal Empresa Brasileira de Transporte Urbano (EBTU), com o objetivo de tocar e monitorar o ordenamento do trânsito nas regiões metropolitanas. No final da mesma década, foi contratado o BIRD II, que conseguia atender a todas as capitais e cidades de porte médio, quando Natal foi incluída. Batinga havia trabalhado com recursos do BIRD I em Salvador (BA), época em que ele estava no Ministério dos Transportes.
Pelo conceito da época, o governo federal mandava uma equipe para coordenar a implantação dos planos nas regiões metropolitanas e novos especialistas eram incorporados ao grupo para em seguida, irem para outros estados trabalhar nos projetos semelhantes e prestarem consultoria. “Mandávamos técnicos para várias capitais do Brasil”, pontua ele.
A elaboração do primeiro Plano Diretor levou pouco mais de dois anos, encerrando-se em 1982, em uma gestão municipal de transição entre José Agripino Maia (que deixava a Prefeitura de Natal para concorrer ao governo do Estado) e Marcos Formiga. Nessa época foi criada uma superintendência para implantar o plano e toda a equipe capacitada para os projetos foram para a então criada STTU, onde iriam executar e operar o novo ordenamento de trânsito, com os recursos do governo federal.
De acordo com Batinga, houve avanços no setor nessa época porque o plano recebeu muito apoio político da Prefeitura para a sua concretização. “Natal virou referência para o próprio Banco Mundial, pois treinava equipes para todo o Brasil e América Latina”, fala. O plano foi pioneiro em alguns pontos, como a fiscalização em praticamente 100% das linhas e o cumprimento, também praticamente integral dos horários das linhas. Todos os terminais tinham relógio de ponto onde eram registrados, na ficha no cobrador, os horários da chegada e da saída dos ônibus, além de controle em pontos intermediários, como o terminal do Alecrim.
Foram criadas as primeiras faixas exclusivas, como o contra- fluxo do Baldo, o da avenida Mário Negócio (Alecrim) e a faixa exclusiva da Rio Branco (Centro). Intervenções no trânsito como na rua Ulisses Caldas, onde foi determinado o sentido único, também foram implantadas nessa ocasião.
Em Ponta Negra, havia pouco fluxo de trânsito e foram criadas linhas opcionais seletivas para lá, com tarifas diferenciadas (mais caras), porque os ônibus eram especiais e adotavam apenas lugares sentados. As linhas da Zona Norte também ganharam a sua implantação e muitas de suas ruas foram pavimentadas pelo BIRD II.
Fonte: Novo Jornal