Tarifa zero no transporte público seria possível?

Longe de ser um objetivo unânime, o passe livre, bandeira do movimento que iniciou os protestos nas ruas de São Paulo, já não é mais visto como uma fantasia pelos estudiosos de Mobilidade urbana. Esta foi uma das conclusões do 3º debate promovido pelo Observatório da Mobilidade na última quinta-feira, com o tema Subsídios às Tarifas de transporte. O consenso entre os debatedores, no entanto, é a necessidade de ampliação das fontes de financiamento dos custos operacionais do transporte público. Segundo o economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Carlos Henrique Carvalho, da Diretoria de Estudos e Políticas Urbanas, o custo para a implementação da Tarifa zero nas cidades brasileiras ficaria na ordem de R$ 50 bilhões por ano, se a atual demanda se mantivesse, o que não acha provável, já que a Gratuidade elevaria a procura.
A estimativa dele é baseada na Pesquisa de Orçamento Familiar de 2009, última elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que mostrou os gastos com transportes, mais o aumento desses custos no período. “A Tarifa zero não é um delírio. Alguém já paga essa conta. E são os mais pobres, que são os usuários do transporte público. Precisamos transferir, pelo menos, parte dessa conta para os que podem pagar mais”, disse o economista e assessor da presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) Marcelo Miterhof, deixando claro que esta era sua opinião pessoal, e não a da instituição.
Ele discorda que a demanda por transportes explodiria como eventual passe livre. Para mensurar o tamanho da conta, o valor equivale ao que a presidente Dilma Rousseff prometeu para os investimentos em novos projetos de Mobilidade urbana e à metade do orçamento do Ministério da Saúde, de R$ 99,3 bilhões, em 2013. Já na região metropolitana do Rio, a Tarifa zero custaria anualmente cerca de R$ 13 bilhões, segundo estimativas iniciais feitas pelo Superintendente de Gestão da Agência Metropolitana de Transportes Urbanos do Estado do Rio, Waldir Peres. “Acho que são recursos pesados demais só para manter o sistema funcionando como está”, disse o técnico.
A quantia representa 16,6% do orçamento total do governo fluminense para este ano, de R$ 78 bilhões. “O que defendo é uma nova política tarifária nacional para os transportes, com ajuda do governo federal”, complementou. Gabriel Siqueira, representante do Fórum de Lutas Contra o Aumento da Passagem, que organizou manifestações contra o reajuste dos ônibus no Rio de Janeiro, diz que a decisão sobre a Tarifa zero é política. “Como o transporte é uma necessidade básica, essa decisão não é apenas técnica, é política.
Além disso, esses custos podem ser questionados”, afirmou. Miterhof rebateu: “O lucro das empresas de transporte pode até ser alto, mas não vamos imaginar que só essa redução poderá subsidiar o transporte público”. O economista defende que o sistema seja financiado por tributos que distribuem renda e não pelo orçamento. “Existe um jeito bem interessante de distribuir renda, que se chama IPTU”. Carvalho, do Ipea, concorda que os subsídios não devem sair dos orçamentos dos governos.
“Não há como evitar que parte do financiamento do sistema de transporte público saia do usuário do carro particular”, afirma o pesquisador, sugerindo que a fonte poderia ser a taxação de estacionamentos, pedágio urbano ou a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE, tributo dos combustíveis que foi zerado pelo governo federal).
A coordenadora do Bilhete único do Estado do Rio, Cristine Petros, que junto com Waldir Peres representou o governo fluminense no debate, disse que qualquer aumento do subsídio deve ser muito estudado para não onerar a população, que, segundo ela, “já está sobrecarregada de impostos”. A Secretaria Municipal de Transportes não enviou representantes, alegando que estavam ocupados com a Jornada Mundial da Juventude.

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