O “Dia Nacional de Lutas Contra o Aumento das Passagens em Defesa dos Transportes Públicos e Pelo Passe Livre”, em Natal, ficou marcado por duas situações distintas: de um lado, milhares de manifestantes foram às ruas protestar pacificamente, do outro, um grupo formado por cerca de cinquenta pessoas, sob o anonimato garantido por máscaras e camisetas sobre o rosto, promoveu desordem, violência e depredação de prédios públicos e particulares. A manifestação durou cinco horas e terminou com os manifestantes sendo dispersos pelo BP Choque da Polícia Militar (PM).
Marcada através das redes sociais, pelos participantes da #RevoltaDoBusão, a passeata de ontem, segundo a PM e Polícia Rodoviária Federal (PRF), contou com um público de 15 mil pessoas, no entanto, os manifestantes acreditam que esse número pode ter sido o dobro. O protesto estava marcado para começar às 17h, contudo, uma hora antes, as vias principais e marginais da BR-101 já estavam ocupadas nas proximidades do shopping Via Direta.
A diversidade de públicos era nítida. Diferente de outras edições da #RevoltadoBusão – onde a maioria dos manifestantes era composta por estudantes –, ontem, havia simpatizantes de outras causas e o protesto não estava restrito à exigência da redução da tarifa do transporte público. Aliás, palavras de ordem comuns nos outros protestos, como “Vem pra rua, contra o aumento” ou “Quem não pula, quer aumento”, pouco foram ouvidas durante a tarde de ontem.
Por volta das 17h, o grupo começou a caminhada com direção ao shopping Midway. Logo no início, o primeiro sinal de que o encontro seria tenso. Membros de entidades estudantis, políticos e partidários que levaram bandeiras foram hostilizados pelo restante do público. “O povo unido, jamais será partido”, gritava a multidão. “Abaixa essa bandeira e levanta a do Brasil”, era outra ordem recorrente. Não demorou para o grupo partidário abandonar o protesto.
O fluxo de pessoas seguiu pacificamente pela BR-101. Em nenhum momento houve a presença de policiais. A avenida estava livre e ocupada pelo povo. O hino nacional era cantado constantemente. O orgulho de ser brasileiro e ocupar as ruas para protestar contra “políticas contrárias ao bem comum” era visível nos rostos da maioria das pessoas. Ao passar pelo viaduto do Quarto Centenário, um grupo abriu uma gigante bandeira do Brasil que, visto de longe, enquadrava o público que passava embaixo do elevado.
Tudo corria tranquilamente, apesar de alguns eventos isolados no colégio Contemporâneo e supermercado Nordestão. Os atos de vandalismo, aliás, eram reprimidos de imediato pela maioria dos manifestantes. Porém, apesar dos gritos de “Sem vandalismo” e “Ei, seu imbecil, você mancha o Brasil”, o grupo de desordeiros não se conteve.
A investida mais violenta aconteceu no shopping Midway. Pedras, tijolos, bombas e outros objetos foram arremessados contra a porta de vidro que dá acesso ao estabelecimento pela avenida Bernardo Vieira. A vidraça da loja Miami Imports, também no shopping, foi quebrada. A ação dos vândalos foi controlada pelos demais manifestantes. Não havia polícia no local. Alguns estudantes formaram uma espécie de cordão de isolamento no local. Mesmo assim, os mais exaltados jogaram novas pedras.
A partir desse ponto, o caráter pacífico do movimento foi maculado. Na avenida Prudente de Morais, mais vandalismo. A reportagem presenciou brigas e pelo menos um furto no meio da multidão. “Fui assaltada. Roubaram minha corrente de ouro”, gritava uma jovem que preferiu não se identificar.
Durante os atos, um carro que transportava a equipe de reportagem da TV Bandeirantes foi alvo de depredação e acabou sendo virado pelos vândalos. A Band se manifestou acerca do ocorrido e informou que as perdas materiais não se limitaram ao automóvel. Segundo a emissora, objetos pessoais dos profissionais que estavam trabalhando na cobertura do manifesto também foram roubados, bem como equipamentos de TV que estavam dentro do veículo. A equipe da Band recebeu solidariedade de um grupo de manifestantes e da imprensa local. Já o comandante da Polícia Militar, coronel Francisco Araújo, ligou para os jornalistas e prometeu empenho na prisão dos criminosos. O repórter Muriú de Paula contou que não havia policiamento por perto e criticou a falta de policiais nas ruas e de segurança para a imprensa e população que participa de forma pacífica. “Esse é o resultado da decisão do secretário de Segurança e do Governo de deixar a cidade entregue aos vândalos que infelizmente estavam no movimento que é legítimo”, reclamou.
O fim da manifestação foi ao lado do Centro Administrativo, com a ação do BP Choque da PM. Aqueles que cometeram atos de vandalismo foram dispersos com balas de borracha e bomba de gás lacrimogênio.
Na Delegacia de Plantão Zona Sul, até o fim da noite, haviam sido presos apenas duas pessoas por ter jogado pedra em um ônibus e o segundo, de menor, pelo crime de roubo durante o protesto em Parnamirim.
Passageiros ficaram a pé a partir das 15h: Os usuários do transporte coletivo de passageiros sofreram com a espera inexplicada pelas empresas de ônibus por mais de três horas. No início da tarde, as paradas estavam superlotadas principalmente no centro da cidade onde a demanda de passageiros superlotou os ônibus. Após o início do protesto, o fluxo de ônibus foi alvo de reclamações em relação a demora, a quantidade menor de veículos circulando, superlotação e porque os motoristas não estavam mais parando nos locais adequados.
Durante o protesto, a escassez de ônibus na cidade aumentou nas proximidades da BR-101 onde os protestos aconteciam e os ônibus não circulavam. A nossa equipe conversou com uma senhora de 49 anos que andou mais de 20 quilômetros e com um aposentado que esperava um transporte intermunicipal. Eles reclamaram da falta de ônibus e questionaram o descumprimento da obrigatoriedade da circulação da frota em quantidade que atendesse a demanda.
Prejuízos no comércio: As lojas do centro da cidade e de bairros comerciais em Natal fecharam mais cedo na tarde de ontem. O motivo foi o protesto que alterou o funcionamento das linhas do transporte coletivo de ônibus em todas as regiões da cidade. A equipe do jornal Tribuna do Norte percorreu a Avenida Rio Branco e nos arredores, onde estão instaladas as maioria das lojas, confirmando o fechamento antecipado dos estabelecimentos comerciais. Apenas as grandes lojas fecharam às 16 horas. A maioria liberou os funcionários às 14 horas.
Os trabalhadores reclamaram da paralisação e das perdas nas comissões em venda e os comerciantes, dos prejuízos administrativos com custeio do transporte de passageiros. Eles apontaram que as mudança na rotina causaram prejuízos pela interrupção nas vendas e perda de alimentos, que na condição de perecíveis foram desperdiçados no fim do dia. A expectativa dele é que o prejuízo seja compensado nas vendas nos próximos dias.
Outras manifestações pelo Estado: Em Parnamirim, os estudantes também aderiram a mobilização nacional e foram às ruas protestar contra a tarifa de ônibus e gastos excessivos com a Copa do Mundo. Cerca de duas mil pessoas, segundo estimativa da Polícia Militar, se concentraram no final da tarde em frente a Prefeitura e de lá, após dispersão, cerca de 500 seguiram até a entrada do Aeroporto, ocupando a BR-101, até o Posto Dudu, e de lá retornaram até a Câmara Municipal.
Com faixas, cartazes e palavras de ordem eles pediam a redução de tarifas e por várias vezes invadiram outras faixas, causando trânsito lento ao longo de seis quilômetros da via. Um dos coordenadores, o estudante Lucas Porpino lembrou que não havia uma pauta única, mas a pluralidade de causas.
Já em Mossoró, o movimento “Pau de Arara” realizou mais um protesto nas ruas da capital do Oeste nesta quinta-feira, 20, acompanhando a mobilização nacional. A luta pela implantação do plano de mobilidade urbana e melhorias no transporte público cresceu e reuniu um número expressivo de pessoas.
Mais uma vez, os estudantes se concentraram na Praça do Pax, no Centro, mas o percurso foi diferente e incluiu passagem pela Avenida Presidente Dutra, na Ilha de Santa Luzia. Em seguida, os manifestantes retornaram para o Centro e encerraram a mobilização no Memorial da Resistência. De forma pacífica, eles reafirmaram a luta por uma pauta que inclui 18 reivindicações.