Se o fluxo viário de Natal fosse comparado ao aparelho cardíaco, com ruas e avenidas nos lugares de veias e artérias, o risco de infarto seria iminente. Hoje, segundo dados da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana (Semob), o sistema de transporte já apresenta um comprometimento real de 25%. São vias em processo de colapso e que já não conseguem dar conta de tantos automóveis. São mais de 322.360 mil circulando diariamente nos cinco mil quilômetros de extensão da malha municipal. Se colocarmos todos os veículos nas ruas – tomando por base apenas o tamanho dos carros populares, com cerca de quatro metros de comprimento –, Natal teria hoje 1,289 mil quilômetros ocupados indefinidamente.
Tendo em vista este comprometimento, o Governo do Estado e a Prefeitura de Natal pretendem, nos próximos quatro anos, despejar quase R$ 1 bilhão em obras para a mobilidade. No entanto, segundo especialistas em trânsito ouvidos pelo Novo Jornal, os investimentos em infraestrutura não são suficientes para resolver a fluidez do trânsito. As obras já vêm tarde e farão com que, em plena Copa de 2014, a cidade estejam cheia de canteiros e trechos interditados.
Para se ter uma ideia do colapso à vista, basta entender que, entre 2000 e 2013, o aumento anual da frota foi de 6,8%, enquanto, no mesmo período de tempo, a taxa de crescimento da população foi de apenas 1,33%. Continuando neste ritmo, em 10 anos, teremos uma proporção de um carro para cada duas pessoas.
Da mesma forma que um coração comprometido, a cidade precisa cortar excessos. O colesterol ruim, neste caso, é o aumento excessivo de veículos particulares. Em 10 anos, houve um aumento de 68%. Eram 191.941 em 2003 eles já somam 322.669. “Não podemos pensar num aumento deste porte para os próximos 10 anos. Natal não irá suportar”, afirma Elequicina dos Santos, Secretária Municipal de Mobilidade Urbana (SEMOB).
Se por um lado o aumento da frota foi exponencial, com 1,2 mil novos carros todos os meses, por outro, os recursos para a ampliação da malha viária foram exíguos. Em 10 anos, a última obra pública municipal para melhorar a fluidez do tráfego foi a construção da faixa exclusiva de ônibus na Avenida Bernardo Vieira, de 6 quilômetros e que custou R$ 4,5 milhões aos cofres públicos. “Esta foi a nossa última obra. Depois disso, nada mais foi feito”, assegurou Santos.
A prefeitura também deu início às ações do Pró-Transporte, um projeto que se arrasta há três anos. Em razão da falta de recursos, as obras foram repassadas do Governo do Estado em janeiro. Do projeto original, o único equipamento que saiu do papel foi o viaduto da Avenida das Fronteiras, construído em 2009, e que só foi liberado ao tráfego no fim do ano passado.
Já o poder público estadual realizou a última grande ação pública em 2007. A construção da Ponte Newton Navarro, ao custo de R$ 194 milhões, e que serve de segunda ligação entre as zonas leste e sul de Natal.
Parte do déficit de infraestrutura, de acordo com representantes dos governos estadual e municipal, promete ser recompensada até 2018. A Prefeitura espera tocar 26 projetos de mobilidade. Os valores envolvidos são superiores a R$ 600 milhões. Já o Governo do Estado promete três obras – ampliação da Avenida Roberto Freire, prolongamento da Avenida Prudente de Morais e conclusão do Pró-Transporte. De acordo com avaliações da Secretaria Estadual de Infraestrutura (SIN), as intervenções devem somar R$ 391 milhões.
Avaliações: Fora dos gabinetes, os motoristas reclamam da falta de espaço e do tempo que levam para percorrer a cidade. “Eu já gastei 30 minutos para cruzar a cidade, isso há cinco anos. Hoje, no entanto, passo quase uma hora para sair de Candelária até a Ribeira”, diz funcionário público Erivelton de Medeiros, 49.
O comerciante Anibal da Conceição, 54, teme que as prometidas obras de mobilidade não resolvam os problemas do tráfego na capital. “O problema é que quando chegarem talvez já não sirvam mais. Todos os dias temos dezenas de novos carros nas ruas”, aponta.
A opinião é partilhada com o taxista Marcos Tarquínio da Silva, 47, que pede faixas exclusivas para o fluxo do sistema de transporte público e táxis. “Seria bom para todo o mundo. O deslocamento seria facilitado. Melhorando o sistema de transporte não teríamos tantos carros nas ruas”, avaliou.
Plano municipal de mobilidade ficou quatro anos engavetado: A lei 12.587 determina que, até o dia 03 de janeiro de 2015, todas as cidades com mais de 20 mil habitantes tenham um documento regulamentando as ações de transporte. Mas, Natal continua sem um plano municipal de mobilidade urbana. A ação tem por objetivo garantir o deslocamento da população aos serviços de saúde, educação, lazer e oportunidades de trabalho e renda.
Segundo o gerente de projetos do Ministério das Cidades, José Alencar, caso o município não elabore o planos até 2015, não poderá firmar convênios com o Governo Federal na área de trânsito e transporte urbano. “Os gestores municipais têm de correr contra o tempo”, afirma.
Segundo Elequicina dos Santos, Secretária Municipal de Mobilidade Urbana (Semob), o projeto potiguar foi iniciado em 2007, no último ano da gestão Carlos Eduardo Alves. Durante os quatro anos do governo da prefeita Micarla de Sousa, afirmou Elequicina, o plano de mobilidade ficou “engavetado” e não houve progresso. Hoje, o documento está passando por ajustes. A ideia é concluí-lo até o próximo mês. Como se trata de uma política pública, o plano deve passar pelo crivo da Câmara Municipal de Natal. A expectativa é que o processo seja aprovado ainda no primeiro semestre deste ano. “Temos um Plano de Mobilidade (2009) já bem desenhado, mas que precisa de adequações para ser viabilizado”, explica a secretária municipal.
As ações de mobilidade da Capital incluem a eficiência dos ônibus coletivos, a requalificação da malha viária e abertura de uma infraestrutura necessária aos modos não motorizados, incluindo acessibilidade plena, com ciclovias e calçadas adequadas.
Prefeitura quer agilizar obras na capital: Em Natal, as obras do que poderia se tornar o chamado “legado da Copa” estão com três anos de atraso. O Município promete gastar R$ 321,3 milhões em intervenções viárias. Todos os serviços estão divididos em três lotes. Estão previstas a construção de corredores viários nas Avenidas Felizardo Moura, Napoleão Laureano, Capitão-Mor Gouveia e Prudentes de Morais, bem como ações estruturais no entorno do Estádio Arena das Dunas.
Segundo Alexandre Duarte, secretário adjunto de Planejamento de Natal (Sempla), e que também é o coordenador de mobilidade da Copa, a demora se deveu à entrega dos projetos à Caixa Econômica Federal (CEF), o órgão financiador para as obras de mobilidade. A assinatura dos contratos financeiros só ocorreu no dia 26 de dezembro. A expectativa da Prefeitura é iniciar a construção do primeiro lote de obras em junho.
Por conta dos atrasos, os projetos já ganharam ajustes. As novas estruturas viárias não devem conter mais as faixas para a circulação de bicicletas e haverá ainda a redução do espaço destinado ao canteiro central. A razão disso é a diminuição das áreas de desapropriação. No primeiro projeto executivo, o número de imóveis desapropriados chegaria a 339. Hoje, a previsão é que este número não chegue a 40.
Já a segunda parte das intervenções, que até agora não foi licitada, ainda deve esperar até maio. “Os projetos já foram aprovados pela Caixa Econômica. Agora, nós temos de realizar a licitação. Nossa expectativa é realizar a licitação nos próximos dois meses”, diz Alexandre Duarte.
O adjunto da Sempla conta que representantes do Ministério das Cidades devem avaliar os projetos na próxima semana. A intenção é garantir uma maior agilidade às obras. O suporte federal será utilizado na realização do Regime Diferenciado de Contratações Públicas.
Licitação dos transportes e nova entrada para Natal: A Secretaria Municipal de Mobilidade ainda não possui data para a entrega da documentação do processo licitatório do transporte público à Câmara Municipal. A medida deve modificar o atual sistema público e readequar a cobrança tarifária nos ônibus. O projeto, que pode incluir ou excluir rotas e linhas, está para ser analisado pela Procuradoria Geral do Município (PGM).
Segundo Elequicina dos Santos, após a análise dos procuradores municipais, os técnicos da mobilidade também devem reavaliar a viabilidade técnica e econômica do projeto. “Temos que analisar bem o texto. Não podemos atrasar ainda mais a aprovação no Legislativo”, diz.
A licitação, aliás, já se arrasta desde 2000. As empresas, atualmente, possuem concessões para atuar como permissionárias do transporte público. “Nossa expectativa é entregar o projeto de licitação junto com o Plano Municipal de Mobilidade. Isso ainda neste semestre”, completa a secretária municipal.
DER: Em 15 dias, o Governo do Estado deve iniciar as obras de construção do Viaduto que liga o prolongamento da Avenida Prudente de Morais à rodovia BR-101, em Parnamirim. Esta é a fase final da obra do prolongamento, com custo total de R$ 59 milhões, e que está sendo realizada há três anos. “Tivemos vários problemas com o cronograma das obras, mas, agora, tudo está correndo normalmente”, explica Demétrio Torres, presidente do Departamento de Estadas e Rodagens do Rio Grande do Norte (DER).
O grande benefício da obra é garantir um novo acesso à cidade pela região Sul. “Até hoje, a BR-101 era o nosso único acesso naquela região. Com a conclusão das obras do prolongamento e do viaduto, a cidade ganha uma nova porta de entrada”, avalia Torres.
Ainda este mês, a direção do DER deve iniciar um diálogo entre as prefeituras que formam a Região Metropolitana de Natal para a integração dos serviços de transportes intermunicipais. Hoje, as linhas atuam de forma independente e cobram tarifas diferentes. “A integração vai facilitar na criação de uma tarifa única. Isso vai garantir uma maior economia para o usuário do transporte coletivo. Além disso, vai fortalecer o transporte público. As pessoas terão mais opções de deslocamento a partir de uma única passagem”, assevera.
Governo do estado apressa Pró-Transporte: A Secretaria Estadual de Infraestrutura (Sin) anunciou para o dia 27 a abertura do edital para a construção do complexo viário da Avenida Roberto Freire. Na semana passada, o Governo do Estado divulgou, no Diário Oficial (DOE), a formação da Comissão Especial de Licitação com a finalidade de realizar o procedimento licitatório, na modalidade de Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC).
De acordo com Kátia Pinto, a obra, com custo de R$ 220 milhões, sofreu atrasos em razão da avaliação dos órgãos de controle ambiental e da aprovação financeira da Caixa Econômica Federal (CEF) – resolvidos apenas em dezembro passado. Para agilizar o processo, o Governo resolveu adotar o RDC para ganhar rapidez e eficiência nas contratações públicas. A modalidade de licitação, no entanto, segundo regulamentação do Governo Federal é aplicável apenas para contratos relacionados à Copa das Confederações e Copa do Mundo de 2014, e Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016.
“O regime diferenciado diminui o tempo de contratação de obra de infraestrutura e só permite a divulgação do valor orçado para a obra após a conclusão do processo licitatório”, diz. Isso porque no modelo tradicional de licitação as empresas passam por um processo de análise de toda a documentação – a chamada habilitação – antes da concorrência de preços.
Neste novo modelo, os concorrentes apresentam suas propostas por meio de lances públicos, e o pregão se encerra com a definição do vencedor, sendo aquele que apresentou a melhor proposta com o menor preço.
Ainda de acordo com Kátia Pinto, os detalhes da obra serão discutidos em uma audiência pública, mas a previsão é que o processo construtivo seja deflagrado ainda neste primeiro semestre. A futura Avenida Roberto Freire terá 12 faixas para veículos, corredores exclusivos para ônibus, passarelas, ciclovias, calçadão e túneis.
A outra ação de infraestrutura estadual será o início das obras do programa Pró-transporte. No próximo dia 27, o Governo encerra a etapa de habilitação do processo licitatório. Até o momento, 28 construtoras estão concorrendo. A ordem de serviço deve ser expedida na primeira quinzena de maio.
O projeto, com orçamento de R$ 97 milhões, contempla mais de 15 quilômetros de ruas e avenidas da Zona Norte de Natal. As obras abarcam as avenidas Conselheiro Tristão e Moema Tinoco, até alcançar a BR-101 Norte, e também as avenidas Tocantínea e Rio Doce, logo após a Ponte Newton Navarro, já na Praia da Redinha. Logo após a ponte, por sinal, será construído um viaduto, que diminuirá o gargalo já existente no local nos horários de trânsito intenso.
O Pró-Transporte também conta com um projeto urbanístico e, em alguns trechos, as pistas sairão de duas para seis faixas. O projeto traz ainda a implantação de 20 km de calçadas, 11 km de ciclovias e 56 terminais de passageiros.
“Com esta obra, a cidade ganha em fluidez e agilidade do tráfego de veículos e na valorização do turismo, em especial na Zona Norte, que receberá novas pistas para acesso a ponte Newton Navarro”, completa Kátia Pinto.
Foto: Ney Douglas (Novo Jornal)
Fonte: Novo Jornal