Augusto Maranhão: “Nós apostamos todas as fichas no processo licitatório”

A política de mobilidade e transporte vem diminuindo a qualidade do serviço e fragilizando economicamente as empresas. Essa é a avaliação do diretor do Sindicato das Empresas de Transporte Urbano de Natal (Seturn), Augusto Maranhão. Para ele, a falta de planejamento do setor público é um dos principais responsáveis pelas dificuldades pelas quais as empresas vêm passando. Recentemente, a Riograndense precisou deixar de operar algumas linhas por problemas semelhantes. “O caso da riograndense é fruto da forma como o poder público vem conduzindo, há muito tempo, a política tarifária. O critério é político, e não técnico”, analisa.
A política de mobilidade urbana será tema do Projeto Motores do Desenvolvimento do Rio Grande do Norte, realizado pelo jornal Tribuna do Norte. O Seminário, 3ª edição de 2012, será realizado no próximo dia 27 de agosto, segunda feira, no Serhs Natal Grand Hotel, Salão Bossa Nova, 1º piso, na Via Costeira, às 8h. Este é o quinto ano do projeto Motores do Desenvolvimento e o tema Mobilidade e Transporte o 15º tema trabalhado desde o início, em 2008. Outras temáticas, como indústria, inovação e tecnologia, educação, turismo, já foram abordadas pelo Motores do Desenvolvimento.
Confira a entrevista de Augusto Maranhão a Tribuna do Norte
Tribuna do Norte: Como vocês estão vendo a questão da Riograndense?
Augusto Maranhão: O caso da Riograndense é fruto da forma como o poder público vem conduzindo, há muito tempo, a política tarifária. O critério é político, e não técnico. Isso ao longo dos últimos 20 anos foi corroendo a capacidade financeira das empresas de ônibus. Isso culminou com a entrega dos serviços por parte da empresa.  Resultado de que? Do fato de que o poder público não tem planejamento e nem projeto. Quando é a hora da responsabilidade, o poder público finge que não é com ele e sai de fininho. Ele joga para a galera, irresponsavelmente. Por que o transporte público só tem um financiador, que é a tarifa cobrada ao usuário, e esta é sobrecarregada por uma série de serviços sociais cuja atribuição é do próprio governo? É a forma injusta de subsídio. É o trabalhador  financiando toda a estrutura social do serviço. O programa do leite todo mundo paga, mas nem todo mundo vai lá buscar o leite no posto de saúde. Mas o programa social do transporte público só quem paga é o trabalhador. É uma conta errada. O que acontece? A tarifa sobe, o prefeito não tem peito político para reajustá-la e fixa um valor político e não técnico. Isso vai descapitalizando as empresas em termos de renovação de frota, investimento, etc.
TN: As pessoas muitas vezes não acreditam nesse pleito do setor.
AM: Nós do setor de transporte público não conseguimos eco em outros setores. Isso não é relativo ao cidadão desinformado não. Estou falando do empresário que paga vale-transporte, o que equivale hoje praticamente ao pagamento do fundo de garantia. Nós não conseguimos apoio na luta para que haja subsídio.  Nós convivemos na rua com os veículos e com a falta de educação das pessoas. Jogar lixo no canteiro central, por exemplo, é dificultar o trânsito. O caminhão da Urbana vai parar ali e interromper toda a via esquerda. Parar com o carro na parada de ônibus também. É preciso, acima de tudo, de cidadania. O transporte acaba sendo o alvo de toda a insensibilidade política e administrativo.
TN: Depois do caso da Riograndense, vocês esperam que algo mude?
AM: Nós lamentamos que a Riograndense tenha que morrer para salvar as almas restantes. É o Cristo. A Riograndense entregou as linhas e agora a sociedade vai entender que o poder público precisa ter responsabilidade na política de transportes. O gestor foi escolhido para gerenciar e hoje entre todos os serviços básicos é o que funciona melhor, apesar de todo este contexto.
TN: Qual a saída?
AM: Se houvesse prioridade para o transporte coletivo, em detrimento do particular, a realidade seria outra. A população de Natal cresce 1% ao ano, mas o número de automóveis cresce 10% ao ano. Por isso que um ônibus que antes dava 10 viagens, hoje dá seis viagens. Tivemos de aumentar a frota, mas em contrapartida a satisfação do usuário não aumentou.  Isso porque os congestionamentos dificultam o tráfego.
TN: Qual a expectativa do setor para a licitação que vem sendo preparada pela Prefeitura?
AM: O setor está no compasso de espera desde março. Em julho, teve uma audiência pública com os compromissos que todos deveriam ter, as rotas, as linhas etc. Nós esperamos a divulgação deste processo licitatório porque entendemos que a partir daí casos como o da Riograndense não poderão acontecer mais. Nós passaremos a ter um instrumento robusto na relação poder público/empresas e que haverá um gatilho de custos. Como o sistema só sobrevive de tarifa, não pode haver congelamento de tarifa porque isso vai desequilibrar o contrato. Nós apostamos todas as fichas no processo licitatório porque haverá um instrumento confiável, que a concessão, substituindo um instrumento precário, que é a permissão, como acontece com as rodovias que cobram pedágio. As responsabilidades ficarão claras de lado a lado.
TN: As empresas estão se preparando para concorrer?
AM: Estamos aguardando que tipo de equipamento precisamos adquirir porque no projeto se prevê a compra de 200 ônibus novos. Precisamos saber se com três ou quatro portas, se é ônibus alongado, micro-ônibus, BRT, etc. A demora está atrasando a compra desses equipamentos. A frota atual só tem veículos até 2011. Ninguém comprou outros esperando essa definição. Além disso, veja como a política governamental está ao contrário. O cidadão que comprar um carro adaptado para necessidades especiais tem subsídio do governo. Mas um ônibus adaptado não tem subsídio nenhum. O elevador é R$ 15 mil, os outros equipamentos também são mais caros. Mas não há subsídio. Tudo isso é preciso discutir nacionalmente, mas o setor não consegue eco, como outras categorias. O sistema de transporte não consegue tirar o ICMS do combustível, como o setor pesqueiro conseguiu. Outros estados fizeram, como o Ceará e a Paraíba. O transporte ferroviário por exemplo tem subsídio.
TN: E a questão da segurança nos ônibus?
AM: Fomos orientados a colocar GPS, câmera, agora o botão de pânico, além de termos doado 170 detectores de metal para a Polícia Militar. Todavia não conseguimos sucesso. Pelo contrário, o número de assaltos vem subindo, por conta da droga. O que a gente busca como solução é o que se faz no mundo todo: tirar o dinheiro dos ônibus. Estamos fazendo uma grande campanha para ampliar o uso do cartão de ônibus. Isso porque o atrativo é o dinheiro do cobrador. O cara não vai para perder tempo, sair catando de um e de outro, mas para o cobrador. Queremos tornar mais seguro o serviço.

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